Mapeamento de Cultura
Um olhar sobre a experiência de trabalho no audiovisual brasileiro
Apresentação dos resultados da Pesquisa Cultura Azeitona 2024, que traz um panorama sobre condições de trabalho, desafios e expectativas de quem faz o audiovisual acontecer.
Este relatório apresenta dados demográficos, indicadores de satisfação profissional, questões de saúde mental e segurança psicológica que foram abordadas de maneira direcionada e também trazidas espontaneamente.
Foram analisados também os principais desafios enfrentados e oportunidades de evoluções.
Um pouco mais sobre a Azeitona e esse relatório
Buscamos entender os modelos de gestão e as relações no audiovisual brasileiro.
A Azeitona é uma consultoria de RH especializada em pensar soluções de pessoas e cultura para indústria criativa. Ela surgiu do desejo de transformar um setor potencialmente apaixonante que ainda mantém práticas prejudiciais. Quando olhamos para o audiovisual, este é um desafio global: no Reino Unido, apenas 12% dos profissionais consideram a indústria mentalmente saudável (Looking Glass 2024); nos EUA, só 31% acreditam que pessoas abusivas em posições de poder serão responsabilizadas (Hollywood Commission, 2023). No Brasil, longas jornadas, ausência de canais de denúncia e desigualdades persistem, apesar de alguns avanços.
A Pesquisa Azeitona 2024 analisa as condições de trabalho e expectativas de 636 profissionais. O objetivo é gerar evidências locais para que organizações públicas, produtoras e as pessoas que trabalham no setor, possam construir soluções que tornem o audiovisual mais seguro e inclusivo. A Azeitona agradece a cada pessoa que respondeu, à Casa Ojô pela divulgação, e ao Grupo de Parentalidades do Audiovisual pelo aprofundamento sobre cuidados familiares. Este relatório é fruto do apoio e das vozes de todos vocês.
A Casa Ojô cria espaços de acolhimento para mediar conflitos da diversidade, oferecendo soluções ancestrais que reduzem desigualdades e promovem bem-viver nas relações de trabalho.
Azeitona é uma consultoria de inovação em Pessoas e Cultura. Desenvolvemos estratégias para criar ambientes livres de assédio, condutas abusivas e seguros para todas as pessoas.
Grupo criado por profissionais do audiovisual que são mães, pais ou cuidadores para troca de apoio e boas práticas na conciliação entre trabalho audiovisual e parentalidade.
Contexto histórico
O audiovisual brasileiro se tornou um dos motores da economia criativa do país. Em 2024, segundo estudo da Oxford Economics para a Motion Picture Association, o setor gerou R$ 70,2 bilhões para o PIB e sustentou mais de 600 mil empregos diretos, indiretos e induzidos — um impacto que reforça o tamanho e a responsabilidade dessa indústria no Brasil. É um setor que cresce, movimenta recursos, gera oportunidades e influencia cultura, imaginário e identidade.
Mas esse crescimento convive com estruturas históricas que ainda moldam profundamente a experiência de trabalho. O audiovisual se desenvolveu globalmente em modelos semelhantes: produtoras familiares lideradas, em sua maioria, por grupos privilegiados. Contratações por projeto e redes pessoais sempre foram o eixo central da dinâmica profissional, o que reforça hierarquias rígidas e silencia denúncias por medo de retaliação.
A regulamentação continua limitada e desigual. Práticas de gestão variam de produtora para produtora, e boa parte do setor opera com jornadas longas, orçamento apertado e pouca previsibilidade. Produções independentes, especialmente, vivem o dilema de entregar resultado sob muita pressão — muitas vezes às custas do bem-estar das equipes.
Mesmo com debates impulsionados pelo #MeToo e por movimentos antirracistas, a inclusão ainda avança menos do que o discurso. Entre 2011 e 2021, a presença feminina no setor permaneceu em torno de 40%, e o crescimento da participação de pessoas pardas e pretas ocorreu de forma lenta e desigual. Nos EUA, houve avanços entre roteiristas e diretoras mulheres entre 2019 e 2022 — mas com progressos menores para mulheres não brancas. No Brasil, o período de 2019 a 2021 registrou até uma leve redução da presença feminina em áreas criativas.
Em resumo: uma indústria que movimenta bilhões e sustenta centenas de milhares de empregos ainda depende de modelos de trabalho que se apoiam em excesso, improviso e desigualdade. É nesse contraste — entre potência econômica e fragilidades estruturais — que se insere a urgência de transformar a cultura de produção no país.
Este panorama sobre hierarquias, cultura de silêncio e inclusão fundamenta o trabalho da Azeitona no desenvolvimento de soluções sustentáveis para o setor. Nossa Pesquisa de Cultura busca compreender como essa realidade global se manifesta nos diversos contextos brasileiros.
Metodologia da pesquisa
Nossa metodologia combina abordagens quantitativas e qualitativas através de questionários online. Levou em média 10 minutos para ser preenchida por cada pessoa, ficou disponível de 30 de abril a 31 de maio de 2024, foi r dentro dos princípios da LGPD e conduzida com total independência pela Azeitona, que mantém a confidencialidade das informações.
  • Independência da Azeitona na formulação e análise das pesquisas
  • Confidencialidade das informações compartilhadas
  • Divulgação ampla dos resultados para todo o ecossistema audiovisual
  • Preservação de identidades físicas ou jurídicas citadas
Sessão 1: Mapeamento geográfico
Distribuição regional dos profissionais do audiovisual pelo Brasil.
Sessão 2: Perfil pessoal
Características pessoais para análise da diversidade no setor.
Sessão 3: Perfil profissional
Funções, experiências e trajetórias dos participantes.
Sessão 4: Mapeamento sociodemográfico
Dados sociais e demográficos para análise de representatividade.
Sessão 5: Experiência de trabalho
Condições e relações de trabalho no audiovisual brasileiro.
Este trabalho vai além do diagnóstico – busca catalisar mudanças concretas no setor, promovendo um ambiente mais saudável de maneira sustentável para todos os profissionais.
Perfil das pessoas participantes
Nossa pesquisa reuniu 636 participantes: 65% mulheres cis, 28,3% homens cis, 2,4% pessoas trans/travestis/não-bináries e 4,4% preferiram não responder.
Na classificação por raça/cor (IBGE): 70,8% brancos, 15,5% pardos, 9,5% pretos. Pessoas com deficiência (PCD) representam 2,7% dos participantes.
Localidade
62% São Paulo (SP)
18% Rio de Janeiro (RJ)
20% Outras cidades/estados
Tempo de Carreira
37% > 15 anos
23% 10-15 anos
23% 5-10 anos
16% 1-5 anos
2% < 1 ano
Liderança
55% exercem cargo de liderança/chefia
40% não exercem
6% não sabem o que responder
Geograficamente, há forte concentração em São Paulo (62%) e Rio de Janeiro (18%). A maioria possui carreira consolidada, com 37% atuando há mais de 15 anos no setor. Homens cis predominam nas carreiras mais longas, enquanto pessoas trans/não-bináries concentram-se na faixa de 5-10 anos. Mulheres cis apresentam distribuição mais equilibrada entre as faixas.
Destaca-se que 55% dos respondentes ocupam posições de liderança, indicando uma amostra com experiência significativa no mercado.
Recorte por função
*Agrupamento adotado de forma recorrente no mercado nacional e internacional.
O que dizem sobre a experiência de trabalho
76% se sentem psicologicamente inseguros ao trabalhar no audiovisual. 70% não se sentem valorizados e não veem perspectiva de carreira e 63% não se sentem livres para expressar suas opiniões.
Os indicadores revelam um contraste: enquanto há orgulho em trabalhar no audiovisual e sensação de autonomia, também existe insegurança, falta de feedback e comunicação deficiente.
Autonomia
51% relatam ter autonomia em suas funções
Confiança na produtora
49% confiam na empresa onde trabalham
Respeito nas relações
60% desejam relações mais respeitosas no trabalho
Abertura para verbalizar
63% não se sentem livres para expressar opiniões
Valorização do trabalho
70% não se sentem valorizados nem veem perspectiva de carreira
Comunicação clara
71% consideram a comunicação pouco clara e transparente
Cultura de feedback
Apenas 27% recebem feedback sobre seu desempenho
Bullying e Segurança
Apenas 24% se sentem seguros contra bullying no trabalho
Segurança psicológica por área de atuação
Pergunta: Encontro ambientes psicologicamente seguros para trabalhar
O dado que mais chama atenção em relação à segurança psicológica é em relação às funções de Produção. Apenas 42% encontram ambientes seguros para trabalhar. Isso significa que quase 60% dos profissionais de Produção não consideram seu ambiente de trabalho psicologicamente seguro.
Vale destacar que 25% dos profissionais das áreas Artística e de Produção relataram ausência total de segurança psicológica (nota 1 na escala original), enquanto na área Técnica observa-se a maior proporção de profissionais (17%) que relatam ambientes muito seguros.
O relatório aponta que 60% dos profissionais da área Técnica se sentem em ambientes psicologicamente seguros, sendo a área com maior percepção de segurança. As áreas Artística e Outros apresentam um índice intermediário, com 50% dos profissionais relatando ambientes seguros.
Segurança psicológica X tempo de carreira
A análise da segurança psicológica por tempo de carreira revela um padrão interessante: profissionais com mais de 15 anos de experiência relatam maiores níveis de segurança psicológica (57%), enquanto aqueles com 5 a 10 anos de carreira apresentam os menores índices (45%).
Mais de 15 anos
Percentual: 57%
Entre 10 e 15 anos
Percentual: 52%
Entre 1 e 5 anos
Percentual: 49%
Menos de 1 ano
Percentual: 48%
Entre 5 e 10 anos
Percentual: 45%
Este padrão sugere que a experiência e a senioridade podem contribuir para um sentimento de maior segurança psicológica, possivelmente devido ao reconhecimento profissional e à capacidade de escolher projetos e equipes. No entanto, mesmo entre os mais experientes, o percentual permanece relativamente baixo, não ultrapassando 60%.
Burnout
57%
Já tiveram diagnóstico ou se afastaram por burnout
38%
Não tiveram diagnóstico nem se afastaram por burnout
5%
Prefiram não responder
A percepção de segurança psicológica varia entre áreas: equipes Técnicas e "Outros" indicaram experiência ambivalente (nota 3), enquanto nas áreas Artística e de Produção, cerca de 25% relataram ausência total de ambientes seguros (nota 1) - um sinal claro de alerta.
Este cenário reflete uma tendência preocupante: em 2024, o Ministério da Previdência Social registrou 472.328 licenças por transtornos mentais, 68% a mais que em 2023. Globalmente, a OMS estima que depressão e ansiedade causem perdas de US$ 1 trilhão em produtividade anualmente World Health Organization (WHO), enquanto cada dólar investido em tratamento retorna quatro em ganhos de saúde e capacidade laboral World Health Organization (WHO).
Temas recorrentes nas respostas abertas
Analisamos os comentários abertos e identificamos os principais temas de preocupação entre os profissionais do audiovisual.
Jornadas excessivas (42%) e assédio de gênero (38%) lideram as preocupações.
Questões contratuais (35%) e discriminação (29%) também aparecem com destaque.
Aviso de sensibilidade: Os depoimentos a seguir abordam experiências reais que podem despertar desconforto ou gatilhos emocionais. Leia respeitando o seu tempo. Observe como seu corpo reage — respiração, tensão, aperto no peito, aceleração dos pensamentos. Se perceber que a leitura está te afetando negativamente, interrompa. Priorize o que for mais seguro para você agora.
Algumas aspas retiradas das respostas abertas
  • "Sinto que o trabalho no set ainda é muito desrespeitado no geral (…) sem nenhum setor ou chefe para quem podemos reportar ou fazer a gestão de conflitos. Nosso trabalho é invisível, e sendo mulher nesse meio, os homens atrapalham o nosso trabalho, sem educação, sem chamar pelo nome, sem respeitar que somos profissionais e precisamos fazer também o nosso trabalho".
  • "Em sets grandes de longas eu só tive experiências ruins. Assédio moral e sexual. O último em que estive faz 6 anos e me mantive fora desse mercado porque me fez extremamente mal psicologicamente (…) Estou sofrendo real e completamente desesperançosa do audiovisual. Prefiro mil vezes trabalhar com produções pequenas".
  • "Acho que o Mercado Audiovisual é muito nichado e tem muita panelinha. Dificilmente você vê pessoas que querem investir em você e te dar oportunidades boas. (…) Privilégio de estudo, de poder se aperfeiçoar e etc. (…) Tem muitas pessoas com mais talento que muita gente que é reconhecido no mercado, que ainda está desempregado".
  • "Eu sinto que os profissionais de audiovisual não estão preparados para uma mudança de trabalho saudáveis. (…) A PJtização deixa os trabalhadores à mercê, sem nenhum direito trabalhista garantido, cumprindo jornadas extenuantes sem amparo e zelo dos contratantes".
  • "O mercado é abusivo e excludente. Tinha poucos acessos antes de transicionar, depois que transicionei, nenhum".
  • "Há uma imensa dificuldade no mercado audiovisual de incorporar pessoas com deficiência como trabalhadoras nas produções. (…) Fui forçado a me afastar do meu trabalho nessa indústria por me tornar uma pessoa com deficiência".
  • “Em minha última experiência de trabalho a presença do RH ajudou muito em me sentir mais segura pois estava trabalhando com pessoas que já haviam desrespeitado minha equipe e o comportamento delas foi bem diferente do dos outros projetos. Deveria ser obrigatório em todos os projetos“.
Camadas críticas identificadas
Saúde mental
Burnout e ansiedade como consequências
Assédio e percepção de omissão
Mecanismos formais inoperantes
Inclusão só no discurso
Diversidade é relatada apenas como intenção
Trabalho invisível
Departamentos sem reconhecimento
Jornada excessiva & orçamento
Cronogramas apertados e cortes de verba
A análise aprofundada das respostas permitiu identificar cinco camadas críticas de problemas interconectados. Na base, questões de horas excessivas e orçamentos apertados aparecem como raiz de outros problemas, gerando um ambiente propício para assédio e impunidade.
A inclusão de fachada e a invisibilização de certos departamentos contribuem para um cenário que culmina em problemas de saúde mental. Esta estrutura piramidal ajuda a compreender como os desafios do setor estão interligados e como intervenções na base podem gerar impactos positivos em toda a cadeia.
Recomendações das pessoas respondentes
As recomendações que surgem dos próprios depoimentos apontam para soluções práticas e estruturais. A limitação de jornada aparece como prioridade, seguida pela implementação de RH de Produção obrigatório e mecanismos independentes de denúncia.
1
Limitar lornada
Máximo de 10h/set + 12h de descanso, com pagamento de hora extra vinculado a contrato-padrão.
2
RH de produção obrigatório
Mesmo em projetos sem grandes players; produtoras deveriam contratar.
3
Mecanismo de denúncia independente
Com prazos e sanções claras, rompendo vínculos de poder locais.
4
Políticas efetivas de inclusão
Maternidade, combate ao etarismo e inclusão PCD (jornada reduzida, set acessível, cotas).
5
Transparência sobre cachês e orçamento
Piso mínimo por função negociado com sindicatos/associações.
Apesar das pessoas que responderam reconhecerem progressos recentes, o sentimento predominante é de frustração: a expectativa alta por mudanças contrasta com práticas diárias que continuam reproduzindo jornadas abusivas, assédio e desigualdades estruturais. Sem compromisso real de canais, produtoras e órgãos reguladores, a cultura tóxica tende a persistir e afastar talentos.
Desafios e oportunidades da Parentalidade no Audiovisual
Uma análise específica sobre como a maternidade e paternidade impactam as carreiras e o bem-estar dos profissionais no setor audiovisual brasileiro.
Pesquisa liderada pelo Grupo Parentalidades no Audiovisual.
Desafios e oportunidades da parentalidade
Perfil da amostra
Cuidado infantil
27% das crianças menores de 4 anos sem creche/escola.
Mulheres recorrem a avós e babás; homens têm menos apoio.
Experiência na gestação
Mulheres enfrentam maior barreira cultural e risco profissional.
1
Licenças e sustento
32% das mulheres e 19% dos homens freelancers planejaram reserva financeira.
Mulheres param por mais tempo | 43% por 3+ meses vs 19% homens.
Dependência de INSS e retorno precoce por necessidade econômica.
2
Clima de trabalho
64% das mulheres e 50% dos homens se sentem constrangidas (os) ao faltar por filha (o).
Jornada de 12h torna compatibilização inviável; mães abandonam posições de liderança.
3
Vulnerabilidades
15% das famílias têm crianças atípicas/DCP, raramente acolhidas.
Mulheres pretas/pardas enfrentam duplo estigma.
1
Tendências positivas
Avanços em bem-estar e formatos híbridos, mas sem políticas claras.
2
Recomendações
Implementar RH de Produção, reduzir jornada, criar fundo para gestantes/pais.
3
Reflexões finais
Ambiente impõe obstáculos desproporcionais às mulheres. Demandas: políticas formais, jornada reduzida e redistribuição de responsabilidades.
Conclusões e recomendações
A pesquisa revela barreiras significativas às pessoas com responsabilidades parentais no setor audiovisual, especialmente mulheres, indicando necessidade de transformação estrutural.
1
Principais Achados
  • Apenas 22% das mulheres têm experiência positiva na gestação vs. 50% dos homens
  • 33% das mulheres sentem confiança para comunicar a gestação vs. 78% dos homens
  • Jornadas de 12h incompatíveis com responsabilidades parentais
  • 64% das mulheres e 50% dos homens constrangidos ao faltar por questões familiares
  • 15% das famílias com crianças atípicas/DCP sem acolhimento adequado
  • Mulheres pretas e pardas enfrentam duplo estigma (racial e de gênero)
  • 27% das crianças <4 anos sem acesso à creche/escola
2
Recomendações voltadas a pais, mães e cuidadores do audiovisual*
  • Políticas Públicas: Legislação específica para trabalho intermitente no audiovisual e jornadas flexíveis/justas
  • Produtoras: Contratação de RH de Produção, mapeamento de profissionais responsáveis por crianças, gestantes e companheiras(os) de gestantes, e criação de protocolos específicos para esses públicos.
  • Players: Fundo de apoio - para mães e pais - durante licenças e capacitação em práticas inclusivas
  • Sets: Espaços para amamentação e horários flexíveis
  • Sindicatos: Acordos coletivos com proteções para responsabilidades familiares
* Trecho ajustado após a publicação da pesquisa para maior clareza. As alterações não afetam os resultados, análises ou conclusões apresentadas.
3
Próximos Passos
  • Grupo de trabalho multissetorial para implementação das recomendações
  • Programas-piloto de jornadas reduzidas e trabalho híbrido
  • Mapeamento de sets amigáveis à parentalidade no Brasil e exterior
  • Nova pesquisa em dois anos para mensurar avanços
  • Campanhas sobre impactos da cultura de trabalho na diversidade
A transformação requer esforços para formalizar políticas, reduzir jornadas e redistribuir responsabilidades. Mudanças beneficiariam não só pais e mães, mas todo o setor, promovendo diversidade, retenção de talentos e ambiente mais equilibrado.
"Precisamos de um setor que não nos force a escolher entre ser mãe ou ser profissional. A criatividade perdida com essa falsa dicotomia é incalculável para o audiovisual brasileiro."
Conclusões finais da Azeitona
O audiovisual é um setor cada vez mais relevante para a economia brasileira e segue crescendo, impulsionado pela nossa criatividade e pela diversidade que marca a cultura do país. E, justamente por ser um território plural — onde a maioria da população é negra e atravessada por desigualdades históricas — temas como respeito, inclusão e segurança no trabalho não são modismos importados nem agendas passageiras. Eles fazem parte da realidade de quem produz no Brasil e afetam diretamente clima, produtividade e reputação.
A pesquisa revela que o audiovisual ainda é marcado por exigências intensas e suporte insuficiente, elevando riscos psicossociais. Embora existam iniciativas pontuais de bem-estar, poucas pessoas percebem investimento contínuo para criação de uma cultura de respeito e ambientes psicologicamente seguros, resultando em altos níveis de estresse, adoecimento e saída de profissionais experientes. Nossa abordagem leva em conta esses atravessamentos sociais e a rotina concreta dos sets: ritmo acelerado, estruturas informais, decisões sob pressão e riscos psicossociais que, quando não cuidados, comprometem pessoas e projetos.
Para quem exerce a parentalidade, os riscos se agravam: jornadas que excedem doze horas, escalas imprevisíveis, sentimento de culpa por falhar em obrigações familiares e impacto negativo na carreira após licenças. Esta realidade afeta principalmente mães solo, pais de origem periférica e cuidadores primários, comprometendo a diversidade e a inovação que o setor afirma valorizar.
A reversão deste quadro demanda práticas de gestão sustentáveis integradas ao planejamento de produção. A revisão e o respeito às jornadas de trabalho, folgas, divulgação antecipada de escalas e intervalos de descanso garantem previsibilidade sem comprometer prazos. Licenças parentais remuneradas e equitativas, treinamentos sobre planejamento financeiro para PJs, apoio ao cuidado infantil e bancos de horas efetivos demonstram que o equilíbrio entre vida pessoal e profissional é valorizado institucionalmente.
A contratação de profissionais de RH pelas produtoras coloca a experiência de trabalho no centro dos projetos, ainda que o papel da função tenha muito a evoluir. Em uma indústria onde a liderança é frequentemente intuitiva, especialistas em comportamento humano, gestão de pessoas e condução de feedbacks geram impacto significativo em curto prazo.
"Problemas complexos só são resolvidos com abordagens integradas. Isso envolve desde a revisão de políticas públicas — como incentivos que condicionem boas práticas de trabalho — até o redesenho das políticas internas de players e produtoras, garantindo condições dignas para quem opera no set. Passa também pela profissionalização da gestão de pessoas, pela formação contínua de lideranças, pela existência de canais de escuta que funcionem, por modelos de financiamento que incluam custos humanos no planejamento orçamentário e por práticas de contratação mais transparentes e equitativas. Quando a cadeia inteira se compromete — da formulação de editais à operação diária no set — o setor avança de forma sustentável e gera ambientes mais seguros, produtivos e criativos para todas as pessoas." Babi Teles - Co-fundadora da Azeitona
Maya Angelou
Poeta, escritora, atriz e ativista pelos direitos civis, Maya Angelou (1928-2014) superou traumas profundos e barreiras sociais para se tornar uma das vozes mais influentes do século XX. Mãe solo aos 17 anos, equilibrou sua carreira artística com a maternidade em uma época de intenso preconceito racial e de gênero.
"Não existe agonia maior do que guardar uma história não contada dentro de você."
Assim como as vozes dessa pesquisa, Maya nos lembra da importância de criar espaços onde todas as histórias possam ser contadas e ouvidas com respeito, especialmente aquelas que revelam as lutas invisíveis de quem precisa equilibrar criação, trabalho e cuidado.